Tempo de recomeçar
Agosto tempo de férias, de descanso, de brincadeiras e de família. Tempo para recarregar baterias, mudar de ambiente, tempo de descobertas. De conhecer novos lugares, novas culturas e de fazer novos amigos. Durante as férias deixamos os problemas para trás, esquecemos o trabalho e as preocupações e dedicamo-nos apenas à doce coleção de memórias, jantares e muitas gargalhadas. Queremos sentir a areia entre os dedos dos nossos pés, a sua brisa do vento a beijar-nos o rosto e o sol a queimar o nosso corpo e a transformar a cor do nosso cabelo. Usamos o nosso tempo para aqueles guilty pleasures para os quais não tínhamos tempo: ver aquela série ou ler aquele livro. Por o sono em dia e dormir até mais não, nem que seja no sofá, ou apenas relaxar e entregarmo-nos à velha máxima italiana do dolce far niente.
Em agosto parece que tentamos protelar o tempo que teima em passar porque não queremos que este período de pausa termine. Queremos prolongar, para sempre, esta sensação de liberdade e de estarmos todos de bem com a vida, até porque, no nosso subconsciente sabemos que setembro está à porta e que, com ele, virá o tempo de recomeçar… Irá começar o novo ano escolar dos filhos e, com ele, uma nova dinâmica, quase uma nova vida. Sabemos que este será também um mês complicado para o orçamento familiar mercê todas as despesas que iremos ter. Todas as decisões terão de ser ponderadas e pensadas, sob pena do orçamento não sobreviver até ao final do mês. Mesmo que os filhos ainda não façam parte da equação sabemos que irão surgir novos desafios a vencer, novas barreiras a ultrapassar. O verão está a terminar e com ele vai o descanso, a paz e a tranquilidade dos dias. Em setembro volta a azáfama, o peso do relógio e a vida sempre a correr, sem que tenhamos qualquer tempo para respirar e simplesmente apreciar o aqui e agora. Voltamos a ser consumidos pelo stress, pelos problemas para resolver e pela pressão do trabalho.
Contudo, nem sempre foi assim. Tempos houve em que estávamos ansiosos por voltar à escola, por rever os amigos e por estrearmos aquela mochila da moda que nos havia sido prometida caso tivéssemos boas notas. Era tempo para fazer novos amigos, conhecer novos professores e aprender novas coisas. Todos os setembros parecia que crescíamos mais um pouco… A mãe ia rever a roupa que tínhamos usado uns meses antes e já nada nos servia, pelo que um novo guarda-roupa era necessário. Estávamos fartos de estar em casa sozinhos, sem nada para fazer e com saudades dos amigos. Não víamos a hora da chegada daquele primeiro dia em que voltávamos ao nosso reino e onde o nosso gangue voltava a ficar unido para criar mais problemas aos professores. Ou então não víamos a hora da chegada daquele primeiro dia em que poderíamos rever aquele rapaz pelo qual tínhamos uma paixoneta desde o ano passado. Certo era que setembro era um tempo alegre.
Assim, quando é que perdemos este encanto pelo recomeço? Quando nos esquecemos que em cada recomeço começam um sem número de possibilidades, quase como se tivéssemos a capacidade de apagar toda uma página e de começarmos com ela totalmente em branco, caso seja essa a nossa decisão? Porque é que em adultos nos custa tanto recomeçar?
Talvez porque a experiência nos trouxe o conhecimento e, com ele, a certeza das dores dos recomeços. Talvez porque a vida nos ensinou a valorizar aquilo que temos e custa-nos deixar isso para trás e começar tudo de novo. Talvez porque a nossa idade adulta não nos permite olhar para um recomeço com os olhos inocentes de uma criança que acredita ainda em sonhos e que pensa que tudo é possível.
Seja como for, a verdade é que nos devemos deixar levar por esses olhos inocentes de criança e acreditar no inolvidável poder de um recomeço… O recomeço trará consigo novos desafios que precisaremos de ultrapassar? Sim! Contudo, a experiência permitir-nos-á ultrapassá-los de forma muito mais célere e efetiva, mercê o conhecimento que temos. Custa deixar tudo para trás, se necessário, e recomeçar? Sim! Contudo, muitas vezes, acabamos por descobrir que esse brutal corte com o passado foi a melhor decisão que podíamos ter tomado e que, se soubéssemos, tê-lo-íamos feito mais cedo. É dificil deixar a nossa zona de conforto e rumar em direção ao desconhecido. É dificil admitir que se errou e que é necessário mudar de estratégia. Contudo, como já debatido numa partilha anterior, um erro é também uma nova oportunidade de aprendizagem. Quantas vezes não gostávamos de fazer o tempo voltar para trás para fazer diferente? Quantas vezes não gostaríamos de não ter dito aquela palavra ou de ter tomado aquela decisão? Ainda que não tenhamos esse superpoder de viajar no tempo e mudar o passado, a arte de recomeçar permite-nos precisamente isso: fazer diferente, tentar uma nova forma, descobrir um novo eu. O recomeço permite-nos, sempre, mudar o futuro!
Assim, olhemos para os recomeços como um novo mar de possibilidades e de novas aprendizagens. Como uma nova série de caminhos que poderemos percorrer e de novos desafios que iremos enfrentar que nos trarão ainda maior conhecimento e experiência. Olhemos para os recomeços como uma oportunidade para nos reinventarmos e para tentarmos, mais uma vez, ser a melhor versão de nós mesmos, porque só não erra quem não tenta, pelo que o mais importante é sempre dar o nosso melhor e tentar porque se tentamos, na certeza de que iremos sempre dar o melhor de nós, nunca ninguém nos poderá exigir mais do que isso.